Palavras no exílio


Faz algumas semanas me vali da palavra macambúzio em uma crônica aqui mesmo no Vida Breve. Soou deslocada no texto cheio de vocábulos tão contemporâneos (ok, vocábulo é também um vocábulo demodê, e demodê, idem), mas a intenção foi justamente essa. Ressuscitar uma palavra em agonia.

O dicionário está repleto delas, todas à nossa disposição, e no entanto hesitamos em usá-las. Malgrado, por exemplo. É ótimo sinônimo para embora, contudo, todavia (ok, tenho certa implicância com todavia). E, contudo, raramente a gente encontra hoje um malgrado no meio da frase.

Por alergia ao beletrismo, encurtamos o vocabulário. Não chamamos mais os jovens de mancebos, assim como nada fenece, simplesmente acaba. Supimpa deixou de ser bacana e os sacripantas, os patifes, os biltres, extinguiram-se, embora ainda andem por aí, aos montes. Há uma espécie de index dos termos de outrora. Outrora? Ops.

Palavras desse jaez (ou tipo) sumiram da língua falada e, na sequência, dos textos também. Há quanto tempo você não escuta alguém ser chamado de pândego? Uma boa notícia preceder esfuziantes alvíssaras ou aquele camarada tristonho, melancólico, ganhar o rótulo de sorumbático?

Certos termos caíram tanto em desuso que as pessoas mais jovens ignoram seu significado. É o caso de lhaneza. E de alcunha. E de perfídia. Certo dia chamei um amigo de janota e ele, ofendido, respondeu que janota é a mãe.

Se realmente causaria estranheza centrar a fala, ou o texto, tão-só em expressões assim, por outro lado é possível lançar mão de algumas delas sem soar parnasiano. Ainda que seja para espantar o mofo das páginas que, bem guardadas, ainda as salvam da aniquilação completa.

Até porque, no exílio que impusemos às palavras, acabaram desaparecendo do mapa belezuras como algaravia, a confusão de vozes que encantava Wally Salomão a ponto de ter virado título de um de seus livros. E também vocábulos que, do som à grafia, parecem perfeitamente adequados ao significado: mequetrefe, para o indivíduo insignificante; quimera, para ilusão; chumbrega, para mau gosto.

Mas nesta crônica não cabem lamúrias. É apenas uma lufada para que as palavras tomem ar. Respirem um pouco. Para então voltar a dormir, em completo silêncio. A jazer dentro dos velhos livros.


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