No texto do classificado, o anúncio pomposo: prédio em ponto privilegiado, no coração de Botafogo, com toda a infraestrutura: garagem, salão de festas, sala de ginástica, churrasqueira, sauna, piscina. O imóvel parecia promissor, e era mesmo, ao menos se tirarmos pela área interna do apartamento. Cuidadosos, os atuais proprietários reformaram tudo, inclusive as partes hidráulica e elétrica, instalaram armários, aparelhos de ar-condicionado. Quando perguntei pela piscina, contudo, deu-se o constrangimento.
“Não chamaria aquilo de piscina”, disse o dono do imóvel. O corretor, sem saber o que fazer, justificou que nas placas do condomínio estava gravado em letras grandes: “Piscina à direita”. Descemos até o play. O proprietário tinha razão. Impossível chamar de piscina aquele tanque coberto, cercado de janelas por todos os lados.
Essa foi apenas uma das tantas pegadinhas em que caí nessas semanas de caça à nova moradia. “Próximo ao Metrô” pode significar dois quilômetros de distância. “Vista do Cristo” às vezes exprime a oportunidade única de, esticando o pescoço janela afora, vislumbrar a parte da mão esquerda do Redentor. A “ampla garagem” tem vagas apertadas e presas. Para estacionar, ou tirar o automóvel, é preciso empurrar o carro do vizinho.
Procurar apartamento no Rio de Janeiro é caminhar por uma estrada pavimentada pela ficção. Para além disso, atestar que, dia após dia, os espaços diminuem. Visitei duas dezenas de imóveis. Alguns ótimos; outros, bons; a maioria, ruim. Todos caros à beça. São apartamentos de bolso, que no entanto não cabem no nosso bolso.
Talvez por conta do aperto — espacial e financeiro —, os cariocas têm se acostumado cada vez mais a viver colados uns aos outros. “A vizinha acompanha toda a minha rotina e eu, a dela”, conta Sofia, minha sobrinha, quando comento sobre a varanda devassada de determinado apartamento. Discussões, jantares românticos, comemorações, sonecas em frente à TV, é possível ver tudo. L. B. Jeffries, o fotógrafo protagonista de Janela indiscreta, faria a festa por aqui.
Ao entrar nesses imóveis de pouquíssimos metros quadrados, sempre me pergunto: mas onde colocar meus livros? Os CDs? Então vem a constatação de que quase ninguém mais mantém bibliotecas, pequeninas que sejam. E, claro, que ninguém mais compra CDs. Mas sou do tempo do taco de madeira, não do porcelanato.
Em um de seus poemas, Carlos Drummond de Andrade fala da procura por apartamento “pequeno, bem situado / onde caibam dois amantes / de frente como de lado”. Exige apenas que caibam discos, livros, lençóis, uísque, biscoitinhos — e não tenha baratas, mosquitos ou vizinhos enervantes. Quem souber de tal imóvel me informe onde é que fica essa casa, rogava o escritor. Peço, por favor, que avise a mim também.
NO COMMENT