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Ilha da Gigóia

Ilha da Gigóia


Ao saltar do táxi, depois de percorrer o muro de tapumes, vejo entre o posto de gasolina e o prédio espelhado da Unimed a pequena rua que me foi indicada. É estreita, quase imperceptível entre tantas construções. “Deve ser aqui”, digo ao pessoal.

São jornalistas que, como eu, trabalharão pelos próximos quatro dias num grande congresso no Riocentro, cerca de 21 quilômetros distante do ponto onde estamos naquele momento.

Assim que dobramos a rua, vem a constatação de que, sim, é ali. No pequeno deck, uma TV transmite imagens para ninguém. Três pequenas balsas estão paradas na margem da lagoa. Numa delas, em troca de um real, atravessaremos até a ilha. A ilha se chama Gigóia.

Ninguém conhece o Hostel Barra Lake, mas basta dizer que é a pousada do Allan e, de pronto, nos apontam o local. Allan mora na ilha há quarenta anos. Viu a Barra deixar de ser aquele lugar ermo e desabitado que escondia a melhor praia da cidade para se transformar num bairro de autoestradas e condomínios. Viu também a chegada dos shoppings, dos restaurantes, o sumiço dos tatuís. A degradação da lagoa.

Allan é falante, não esconde o prazer de discorrer sobre o lugar, para onde seus pais se mudaram nos anos 1970. “A Gigóia é a maior entre as onze ilhas da região”, diz, sem esconder certo orgulho. “E a mais populosa”. Em rápida pesquisa, descubro que moram no arquipélago da Lagoa de Marapendi cerca de doze mil pessoas. Eu, que vivi na Barra por duas décadas, jamais imaginei que houvesse tanta gente naquela área.

Na pousada do Allan, às margens da lagoa, há árvores frutíferas e uma pequena horta. Há silêncio, sobretudo. Se sentamos para ler ou conversar, Lola, a cachorra que zela pela propriedade, aproxima-se em busca de afago ou comida. Vez por outra o vento traz o cheio acre da água. São anos e anos de esgoto, e descaso.

Do lado de fora, ruas de terra batida, casas geminadas, uma mercearia, alguns bares, muita simplicidade. Todos se conhecem. Nós somos os forasteiros, e há cada vez mais forasteiros, a se tirar pela quantidade de pousadas que hoje funcionam na ilha. É possível se ouvir diálogos em castelhano, em inglês. Mas o clima interiorano perdura.

“Lá na cidade”, alguém comenta durante o café da manhã na pousada. “Aqui também é cidade”, Allan interrompe, fazendo troça. Incrível mesmo pensar que, do outro lado da lagoa, a metrópole se dá a ver nos carros que passam em alta velocidade, no burburinho das buzinas, nas obras que prometem o novo. Tão perto, tão longe.


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